quarta-feira, 27 de abril de 2011

Encontro de Águas



Nunca ví chover tanto! A Praça da Bandeira estava inundada, os carros estavam boiando à deriva, os rios transbordaram fazendo das ruas lugares de correntezas fortes, mas isso o Rj TV já divulgou no dia seguinte. O interessante é ver pessoas de todas as classes sociais, credos, etnias entre outras diferenças, se espremendo nas salvadoras marquises. Alí, ví uma mulher grávida, ví uma que tinha um recém-nascido nos braços, ví gente velha e nova com o mesmo semblante, com o mesmo sentimento, ví gente que esperava com classe e ví  gente fazendo barraco enquanto xingava os governantes...
O recorde de ofensas foi destinado ao casal Garotinho e Rosinha Mateus, que em épocas de poder nunca fizeram nada pela cidade, faziam somente políticas assistencialistas para ganhar votos. Um homem que morava na rua da frente disse que se não fosse por Cesar Maia aquela água não escoaria em menos de uma semana. Os olhos fixos na correnteza que passava pela Doutor Satamini na altura da praça Afonso Pena na Tijuca, apresentava um novo dado constantemente... desde um novo carro que parou enguiçado à uma pessoa que enfrentava o dilúvio com a certeza que o sacrifício seria uma vantagem... Ledo engano!
Eu e meu sogro estávamos a cinco ruas da casa dele e apesar de estarmos de carro tivemos que subir a calçada e esperar embaixo de uma marquise. Quando nos deparamos com aquela discussão política tão acirrada meu sogro ficou boquiaberto e eu fiquei com um sentimento de orgulho daquelas pessoas. Não que eu concordasse com as coisas que foram ditas, mas pelo o exercício da discussão política. Embora superficial era democrático e isso é um dado riquíssimo, por que esse encontro geralmente é provocado, ele quase nunca acontece espontaneamente... Enquanto discursava um senhor que trabalhava na Petrobrás e fazia um curso noturno de especialização na Fundação Getúlio Vargas, rebatia o porteiro o mesmo assunto e com a mesma propriedade... Convenhamos, isso não acontece todo o dia...
A chuva começara a cair 8:40 da noite e às 4:00 da manhã cheguei na casa do meu sogro. Sei lá de quem é a culpa... fiquei triste por ver a cidade inundada daquela forma... Fiquei compadecido das pessoas que moravam longe e que dependiam do transporte público... Fiquei impressionado com a discussão política... E fiquei feliz pelo encontro daquelas pessoas.

sábado, 9 de abril de 2011

O Artista Popular



Meu sono me surrava e ainda era sete horas da noite. Sem a mínima piedade o sono olhava pra mim como se dissesse: Pague meu preço amante da Madrugada! Filho ingrato do Sol, porque o traiste?!?!?!! Tome a ira do meu poder!
A criatividade noturna é uma prática cara e é difícil negociar com o sono, a cafeína e outras inas também tem um preço... preço alto demais às vezes. Não gosto das idéias mais pesadas…

Terminada a gravação em Vargem Grande/Pequena,(não sei qual é qual), iniciava-se a odisseia que facilmente daria uma trilogia ou mais... Mas o trajeto não é o foco de hoje.
Nesse dia apenas estava preocupado em chegar em casa, tinha dois ônibus para enfrentar e muito tempo para encontrar a melhor posição para dormir entre uma freiada e outra. Pegamos a Linha Amarela, (238), e quando saltei já era pra atravessar a rodoviária para pegar o 233. Era um ônibus com ar-condicionado, o que agravou o caso do sono. Tinha bastante gente sentada, mas não estava lotado. Uma velhinha com cara de rica que foi roubada pelo filho maldoso e sem caráter senta-se ao meu lado com a pompa de uma Orleans & Bragança... e no próximo ponto entra pela porta de trás uma figura com um violão que agradecia ao motorista pela oportunidade, tinha uma roupa emgraçada, uma peruca amarela com uma boina por cima, camisa listrada, meia colorida e um allstar no pé… Foi para frente da condução e todos olharam ele com cara de eu não acredito que você vai fazer isso, nós queremos dormir. Até que surgiu a seguinte frase acompanhada do primeiro acorde. RESPEITÁVEL PÚBLICO!!!! PREPAREM-SE O ESPETÁCULO VAI COMEÇAR! Ele contou uma poesia musicada linda… Inventou que tinha uma ajudante lá atrás (final do ônibus) e nós acreditamos naquela mentira, ele conversava com a ajudante “Michele” o tempo todo e cantava uma música que tinha a palavra, Fenomenal, como refrão. E o ônibus já cantava com ele em alto e bom som! O motorista piscava as luzes do ônibus toda a vez que ele pedia… Ele dizia que a Michele gostava desse efeito de luz. O ônibus não era mais uma viagem e sim um show, duas meninas levantaram os braços e começaram a balançar no rítimo da música e eu acendi o esqueiro lá no alto como se estivesse no Rock and Rio ou cantando We are the World. Todos agora cantávamos a música dele… E ele ao nosso som contou uma poesia sem deixar de tocar os acordes no violão. Todos estávamos na mão dele… Para nós ele era um artista consagrado. E ele de fato é! Pra nós é! Quando de repente aquela mulher com cara de rica e soberba olhou pra mim e disse com toda aquela pose: Ainda existe coisa boa no mundo, SALVEM O ARTISTA POPULAR! 

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Os olhos da Alma

Quando meu pai morreu eu queria ficar perto dele porque sabia que não o veria mais. Embrulhei o corpo dele num lençol e fiquei de olhos fechados passando a mão no rosto dele para gravar o sentimento das feições faciais dele em mim. Tinha que levar esta última recordação. Levei muitas outras maravilhosas dele em vida, mas eu não queria levar somente a do caixão depois do acontecido. Sabia que ele não estava mais alí e que nada que eu fizesse o traria de volta. Ele estava oco, era só um recipiente... Neste momento eu tive certeza da alma. Tive que senti-la fora para ter certeza e entender que ela esteve dentro. Então à partir daí quando eu me concentro, fecho meus olhos e consigo sentir as feições do rosto do meu pai impressas na minha mão e mato de forma imprecisa minha saudade. É claro que eu já sabia da existência de algo que mora em nós e que nos faz únicos, mas pra mim não era tão forte... Descobri que nossa alma nos dá sinais de existência o tempo todo...  Enquanto estamos vivos estamos repletos dela. Quando a emoção nos vem aos olhos é como se ela gritasse: Socorro!!!!! Me vejam!!!! Eu estou Aqui!!! Não duvide de mim! Deus me deu pra você!!!!
E sou muito grato pelo dom que Deus me presenteou, por que no palco consigo me enxergar quando a emoção me grita aos olhos. 




Teatro Manaus, um teatro mais três galerias lotadas de um público muito talentoso.